Texto - A Despedida de Zé Ninguém do Baixio das Aroeiras

Na nova música "Parte que não te cabe", já uma presença obrigatória no repertório dos shows do Mucambo, a introdução da música tem um recital acompanhado da flauta de Lucas Ribas e do canto da acauã, além do canto gravado das rezadeiras da comunidade de Boa Madeira, zona rural de Macaúbas.

O texto recitado na introdução da música na verdade se chama "A Despedida de Zé Ninguém do Baixio das Aroeiras" de autoria de Maurício Chaves (baixista do Mucambo). Nos shows, por conta da aparição da vaca com a sua performance, algumas pessoas não se atentam para o texto forte de Maurício... para minimizar este porém, vai abaixo o texto e uma ilustração especialmente criada para ela.

Desenho de Eduardo Cambuí Junior

A Despedida de Zé Ninguém do Baixio das Aroeiras.

"Silencia na caída da tarde...
O sol se esconde afugentado com medo,
O agouro sublime ecoa nas terras do baixio
Rasgando os gravetos da caatinga.
Chora o menino de tristeza,
Chora a mãe de agonia.
A Acauã canta com os seus olhos para o céu
Cravada no topo da aroeira.
É a ladainha do corpo falecido.
A oração derradeira do corpo maculado
É a ejaculatória do irmão Severino.

A incelença do barquinho do Jordão.
A despedida derradeira da terra marcada.
Não se ouve mais o batuque da enxada
Nas terras encascalhadas de lajedo.
Seu chapéu do torno não sai,
Nem a cabaça e o facão.
De tristeza o cachorro não levanta,
O canário não canta,
O carro de boi não trilha no estradão.
Não mais se vê nas capoeiras de caatinga de porco os estalos de Zé Ninguém...
Tem agora morada derradeira,
Recostado em tábua de mandacaru.
E a ladainha sertaneja da ave agoradeira
Lhe despede do topo da aroeira,
Melodiando o seu funeral
Nas terras do norte,
Dos filhos de Maria.
Se despede da famia.
Recebe agora a terra prometida
Na cara!
Nos olhos de quem não mais enxerga,
Na boca de quem não come mais,
No peito de quem não mais trabalha,
Nas mãos de quem não mais precisa."

por: Maurício Chaves (Arriégua)